R O T A E R O M A N A E T R I B U N A L
SENTENÇA - AÇÃO DE REANÁLISE DE EXCOMUNHÃO
PROT N 025/2025
ARE N 003/2025
RELATOR: Dom Gabriel Cardeal Monteiro
REQUERENTE: Sr. José Lucas
INTERESSADO: Dom Samuel Henrique
INTERESSADO: Dom Ryan Victor
ANO JUBILAR DE 2025
"A ESPERANÇA QUE NOS RENOVA"
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de reanálise de excomunhão proposta pelo ex-sacerdote José Lucas, excomungado ipso facto, para a reanálise de seu estado canônico.
O Sr. José Lucas interpôs a reanálise de sua excomunhão latae sententiae, alegando questões relacionadas ao seu comportamento passado, com a intenção de retornar à plena comunhão com a Igreja. O processo foi conduzido respeitando os preceitos canônicos e o direito de manifestação dos interessados.
Este Eminentíssimo Relator, no exercício de sua jurisdição canônica, recebeu a presente ação por meio de Despacho, procedendo à verificação dos pressupostos processuais indispensáveis à sua admissibilidade. Em atenção ao devido processo e em conformidade com as normativas aplicáveis, determinou-se a intimação de dois interessados, aos quais foi concedido o prazo de três (3) dias para a apresentação de seus pareceres individuais, devendo ser protocolados no Palácio da Chancelaria. Posteriormente, os referidos pareceres foram regularmente submetidos à minha apreciação para análise e deliberação.
Dessa forma, observadas as formalidades legais e a plena instrução do processo, passo à devida apreciação da matéria sub judice.
O Primeiro Interessado, Dom Samuel Henrique, prefeito do Dicastério para o Clero, manifestou parecer favorável à retirada da pena de excomunhão do requerente. Alegando que a problemática não foi necessariamente o iter cismático e que, com efeito, o requerente mostrou-se muito perseverante na busca pela reconciliação na Igreja, não obstante, alegou que refletiu certa ambição pelas posições hierárquicas da Igreja ao integrar em uma comunidade cismática como membro do alto clero, para findar, alegou a procedência, com a condição temporal da "purificação" dessa ambição.
Ainda, quanto ao exposto acima, alegou, In verbis:
"Sua perseverança em iniciar os processos me impressionou, isto foi um ponto bem positivo. Sem contar que o mesmo ao cometer o cisma, achou que o ato em si não era propriamente um cisma, imagino que esse seja o motivo de sua busca não tão demorada pela reconciliação."
O Segundo Interessado, Dom Ryan Victor, manifestou parecer favorável à retirada da pena de excomunhão do requerente, alegando em seu parecer, que embora demonstrava-se um sacerdote ativo e que não tem passado relacionado a comportamentos inadequados com os membros da Diocese e "atitudes contrárias a dignidade sacerdotal", foi inclinado por ambição ao erro do cisma ocasionando na excomunhão ipso facto, e que não houve nenhum bom motivo para o feito, mesmo durante sua consumação. Alegou ainda a desconfiança que seu retorno poderia ocasionar no apostolado, visando que, in verbis: "Nosso intuito é justamente levar para os jovens o Verbo Encarnado de Deus. Muitos jovens estão perdidos nesse meio virtual, com olhares na luxúria, drogas, apologias ao crime, profanações; nossa missão é muito mais importante que usar uma cruz peitoral, anel episcopal e um solidéu cotidianamente. Requer responsabilidade, maturidade, respeito, amor e zelo pela missão."
Ainda, embasando-se no tema aludido, alegou sobre as provas apresentadas contra o requerente, in verbis:
"Nas provas do cisma que foram passadas, o mesmo mostrou que foi atraído por cargo, já que lá possuía um ofício alto. Nisso, chamou outros membros prometendo algo parecido. Ou seja, algo motivado por cargos e sem uma boa finalidade."
Encerrada a fase instrutória e cumpridas as formalidades de estilo, foram os autos remetidos à conclusão para a devida prolação da presente sentença. Encerro, assim, o relatório, e avanço ao mérito. Decido.
Observo ab ovo, os seguintes requisitos para a procedência da Ação de Reanálise de Excomunhão:
I) O Verdadeiro arrependimento do excomungado pela prática do delito que ensejou sua excomunhão;
II) O Completo abandono do delito vetor da excomunhão.
Ressalta-se que ambos os requisitos são completares um ao outro, observando-se que não haverá verdadeiro arrependimento pela prática do delito, se ainda permanecer no vício do erro.
Após a análise dos pressupostos, passa-se a análise do animus agendi do sr. requerente, visando que os pressupostos estabelecidos pelo cânone 1323 - da realidade - (sobre os sujeitos passíveis as sanções canônicas) estão todos negativos, e que o requerente não defendeu tese sobre o tema, passo a análise dos pareceres.
Ab initio, dispensa assinalar que o presente meio processual não se configura como o instrumento adequado para a análise da conduta pretérita do agente, visto que a matéria em questão deve se restringir à reavaliação de sua excomunhão e que Ação de Reanálise de Excomunhão tem por escopo exclusivo a apreciação da procedência ou improcedência do retorno do sr. requerente à comunhão com a Sé Apostólica, sem que promova-se a rediscussão exaustiva dos fatos que ensejaram a sanção ipso facto do delito. Contudo, mostra-se necessário a devida atenção aos dados e registos dos atinentes ao sr. requerente, a fim de garantir a justa aplicação do direito.
Considerando a avaliação dos interessados, exorto que o parecer exarado não se limite à exposição de dados e registros pretéritos do sr. requerente, mas também contemple uma análise substancial convicta de sua atual condição canônica, verificando-se o cumprimento dos requisitos supra para a remoção da excomunhão. Ademais, impõe-se a prudente averiguação acerca de eventuais riscos que o requerente possa apresentar à Sé Apostólica, resguardando, assim, a integridade do apostolado.
Superado este ponto, ainda que correta a aplicação da penalidade de excomunhão ipso facto, tal fator não deve ser o único exclusivo para a manutenção do estado canônico irregular do requerente. Com efeito, conforme nobre consignado nos autos, a pena de excomunhão reveste-se de natureza essencialmente remediativa (medicinalis), sendo imposta não com o propósito de segregação do excomungado, mas sim para: I) proporcionar-lhe a oportunidade de um exame profundo de consciência, conduzindo-o ao reconhecimento de suas faltas e ao devido prejuízo; e II) preservar a comunidade eclesial da influência de concepções dissociadas do Magistério da Igreja. Dessa forma, evidencia-se a dupla específica da pena: de um lado, seu caráter curativo em benefício do excomungado; de outro, sua função preventiva na salvaguarda do rebanho de Cristo.
Quo facto, considero parcialmente que ambos os propósitos foram alcançados, já que por sua vez não foram integralmente respeitados os requisitos supra para a retirada da pena, deste modo tornando-se parcialmente favoráveis com os objetivos remediativos da excomunhão, não implicando no entanto em sua vedação.
Desta forma, observo que a natureza gravíssima do delito de cisma, o qual, por sua própria essência, implica ruptura imediata e consciente da plena comunhão com a Igreja, cumpre reconhecer, todavia, que transcorridos diversas tentativas de remediação e demonstração de arrependimento pelo delito, verifica-se que o requerente, distanciando-se do iter cismático, voluntariamente e diligentemente buscou após diversas tentativas este egrégio Tribunal a fim de submeter-se à devida apreciação canônica da excomunhão em que incorreu. Após acurada análise dos autos e dos elementos probatórios coligidos, constata-se que foram parcialmente demonstrados os requisitos indispensáveis à concessão da remissão da pena canônica, nos termos do cân. 1347 §2, no entanto, pode-se afirmar, com segurança moral, que foram atingidos os fins propriamente medicinais da sanção.
Ainda, a Igreja, fiel ao mandato do Senhor de perdoar "setenta vezes sete" (Mt 18,22), não se furta ao dever de promover a reconciliação eclesial. Para tal, dispõe de instituições adequadas ao diálogo com as comunidades separadas, as quais, embora não plenamente inseridas na única Igreja de Cristo, conservam elementos da fé. Este princípio foi reiterado na reforma da Cúria Romana, promovida por Sua Santidade, o Papa Gregório V, na Constituição Apostólica Praedicationis Ministerium. No presente caso, à luz das manifestações de arrependimento sincero e do pedido reiterado de reconciliação, verifica-se que se encontram parcialmente preenchidos os pressupostos objetivos e subjetivos que permitem o restabelecimento da plena comunhão eclesial do requerente, visto que, se faz necessário por parte do requerente se afastar do desejo pelas posições na hierarquia. Portanto e diante de fundadas razões, a remissão da pena e a consequente reconciliação devem ser deferidas, conforme o espírito da justiça restaurativa própria ao direito penal canônico, no entanto, se faz ressalvas.
Ex positis, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido de retirada de excomunhão requerido pelo sacerdote excomungado ipso facto, José Lucas e ainda mais CONSIDERO:
I - RETIRO a excomunhão latae sententiae do Sr. José Lucas reservada pela Sé Apostólica ipso facto bem como revogo todos os efeitos e condições;
II - SOLICITO ao Dicastério para o Clero para incardina-lo numa circunscrição eclesiástica;
III - SOLICITO que o sr. requerente tenha um acompanhamento mais estreito por parte do governo eclesiástico de sua futura Diocese e pela Nunciatura Apostólica da nação correspondente;
IV - CONCEDO permissão ao sr. requerente de procurar ao Dicastério para a Unidade dos Cristãos afim de reformular suas ideias e ideais.
Ainda mais, DETERMINO:
I - Que o sr. requerente caso vier a ser excomungado novamente, o mesmo não possa entrar com outro pedido de recurso após 10 meses da oficialização de sua excomunhão, sem ressalvas.
Diante de todo exposto, por questões doutrinárias, faço por bem RECOMENDAR:
I - Que o sr. requerente receba por parte da Diocese, da Nunciatura Apostólica ou do Dicastério para o Clero (dependendo da gravidade) uma suspensão ferendae sententiae ou o interdito, caso o mesmo vier a criar discórdia com alguma autoridade eclesiástica ou que haja percepção de vanglória ou ambição em seu ministério;
II - Que se forem observadas contrariedade nos cânones 417 e 441 o sr. requerente não venha receber tais promoções até que atinja mais maturidade para assumi-las.
Dado e Passado no Palácio da Chancelaria em Roma, sob o Pontificado de Gregório V, ao quarto dia do mês de maio do ano jubilar de 2025.
✠ Gabriel Cardeal Monteiro